Editoriais


As edições de Comunità são hibridas e ricas de conteúdo surpreendente. Se na capa da edição passada falamos de novas soluções diante da tecnologia que avança durante a pandemia, nesta propomos uma volta ao que há de melhor na Itália. O Made in Italy é surpreendente porque não é um produto de grandes empresas internacionais, mas graças a uma interrelação, colaboração e competição secular entre tantos pequenos artesãos e produtores que conquistou vocações territoriais de altíssimo nível.
Com a crise, alguns milagres são possíveis de serem observados. E justamente nas pequenas realidades nasce a esperança. Ao buscar a saída para a crise, uma dica promissora foi o que jovens italianos buscaram ao olhar para o próprio quintal. Escolheram uma porta no próprio território e nas suas elevadas vocações. E isso não significa um enclausuramento, mas, ao contrário, transformar com mecanismos eficientes o potencial da própria horta e sendo cidadãos do mundo, mas reconectados com uma identidade fortemente reencontrada.
Na contramão da globalização, sem abrir mão da tecnologia. Aliás, uma das vertentes ideológicas para a globalização foi a promessa de que enriqueceríamos trabalhando menos. Não é o que acontece no Brasil e na maioria dos países. Na realidade dos fatos, aconteceu o contrário. A globalização sem regras empobreceu, tornou o trabalho um modelo standard, importamos objetos de baixíssima qualidade que duram pouco e são jogados no lixo em pouco tempo. Fomos levados a ser a descarga de produtos fabricados do outro lado do mundo com peças introduzidas e muitas vezes programadas para ter vida curta. Objetos que sofrem modificações mínimas, tornam o anterior obsoleto e o recente um desejo de consumo.
Mas a pandemia da covid-19 nos trouxe também um olhar onde o simples é o necessário e instigou jovens a lutar pela sobrevivência. Como aponta nossa repórter em Roma Gina Marques a retomada dos trabalhos nos campos agrícolas se deu por uma juventude inquieta. É notório que a mão de obra se escasseou em todos os mercados. Na agricultura italiana, essa falta foi severamente sentida pelos produtores. As perdas foram da ordem de 12 bilhões de euros. Imagine somar o que todos os países perderam com a pandemia? É tudo incalculável e ainda mais dramático porque milhares partiram. Como resposta a essa monumental tragédia, só há um verbo a ser seguido: transformar. E isso vem sendo feito de forma resiliente e perseverante na história italiana. Como ressalta o Istituto di Servizi per il Mercato Agricolo Alimentare (Ismea), mais de 56 mil jovens com menos de 35 anos comandam empresas agrícolas da Itália. Não há parâmetro na União Europeia. Essa pujança dos jovens da bota mostra um País que sempre foi e sempre será um dos mais contundentes exemplos de transformação de um povo, indubitavelmente o melhor exemplo do que há cerca de 250 anos proferia o filósofo grego Heráclito, de Éfeso: “Nada é permanente, exceto a mudança (…) ninguém entra em um mesmo rio uma segunda vez, quando isso ocorre já não se é mais o mesmo, assim como a água será outra”. Ou seja, tudo o que está e existe transforma-se. Tudo muda no mundo. Vivemos essa constante mudança. Não existe história estática. Nada é inerte. A Itália sempre se mostrou assim, e nesta edição de Comunità esse espírito transformador apresenta-se latente.
Boa leitura!